A estratégia da Cumbuca para ser a 'conta da família'

A Cumbuca, do jovem Daniel Ruhman, quer reinventar a conta conjunta no Brasil. Uma modalidade que caiu em desuso no país, representando menos de 1% do total de contas bancárias. Mas por que apostar em algo praticamente nem utilizado mais? Para responder a essa pergunta, precisamos contar um pouco de como surgiu a startup, que nem se chamava Cumbuca, mas sim Comadre.

Em 2020, assim que estourou a pandemia no Brasil, Daniel estava à frente da UmHelp, uma plataforma que conecta clientes a diaristas. O negócio, que havia sido fundado um ano antes, sofreu no início da crise, claro, e precisou ser interrompido. O jeito foi pivotar para um modelo de negócio com foco em resolver a vida financeira de autônomos. “A gente mostrava quanto de dinheiro ia sobrar antes de pagar uma conta, por exemplo”, conta Daniel.

Ainda como Comadre, a startup foi selecionada no ano passado para a Y Combinator, e recebeu da aceleradora um primeiro cheque de US$ 125 mil. “Lançamos o produto muito rapidamente, no modelo startupeiro, com KYC manual, e percebemos que o pagamento mais comum que tínhamos era entre pessoas da mesma casa, ou seja, gastos compartilhados, como aluguel, mercado etc.”

Foi aí que o empreendedor enxergou a oportunidade de construir um app para a família, no modelo “multiplayer banking”, em que cada pessoa tem uma conta individual, mas todos do grupo conseguem enxergar como o dinheiro coletivo está sendo utilizado. “Brinco que é como se fosse o inverso do split de pagamentos.”

De certa forma, o conceito da Cumbuca lembra o do app Splitwise, bastante usado por viajantes e estudantes para compartilhar despesas. A principal diferença aqui é que a Cumbuca é transacional, e opera apenas via Pix. Pela conta, os usuários podem dividir qualquer Pix ou boleto, como delivery de comida, mercado, aluguel ou conta de luz.

O lançamento oficial da plataforma ocorreu há pouco mais de uma semana, depois de a fintech ter rodado uma versão beta com um total de 100 famílias.

Daniel Ruhman, fundador da Cumbuca (Divulgação)
Daniel Ruhman, fundador da Cumbuca (Divulgação)

Os casos de uso incluem, por exemplo, pessoas que colocam o “dinheiro da casa” para funcionários fazerem compras de mercado, ou ainda um grupo de cinco psicólogos que utilizam a conta para dividir os gastos da clínica.

A fintech cobra uma mensalidade fixa de R$ 19,90 por grupo de usuários, independentemente do número de membros. O primeiro mês é gratuito. O app está disponível na App Store e Google Play.

Iniciador de pagamentos

Por ora, a Cumbuca – que usa infraestrutura de um player de banking as a service (BaaS), de nome não revelado – opera no modelo de custódia, até que consiga atuar como iniciadora de pagamentos (ITP), uma figura regulatória criada pelo Banco Central (BC) no âmbito do Open Finance.

Na prática, esta licença permite iniciar transações de pagamento, sempre com o consentimento do usuário, reduzindo a necessidade de intermediários. Até agora, apenas três empresas (WhatsApp, Celcoin e Quanto) conseguiram aval do regulador para operar com essa licença.

A Cumbuca, por sua vez, entrou com o pedido no fim de 2021 e espera receber a autorização no segundo semestre deste ano. No processo, está sendo assessorada pelos escritórios BZCP e CBS Advogados. “Seguimos no modelo de custódia até conseguir a licença e também os bancos estarem prontos para operar com tecnologia de iniciador de pagamento.”

Com expectativa de chegar a cerca de 25 mil famílias neste ano, a fintech quer atingir as classes mais baixas. “Nossa grande aposta é que os filhos façam o onboarding do app para os pais”, explica Daniel, que enxerga no Open Finance potencial para melhorar o acesso a serviços financeiros básicos nas camadas mais baixas da população.

“Open Banking é poder sacar o Bolsa Família no mercadinho do bairro, sem taxa.”

Para financiar o crescimento, a Cumbuca levantou recentemente um seed money (valor não revelado) com mais de 20 investidores e empreendedores, entre eles, Verve Capital; Renato Freitas, um dos fundadores da 99; Bruno Balbinot, fundador da Ambar; Fernando Gadotti, fundador da DogHero; Pedro Sirotsky, da Barrah/B1; Guilherme Weege, CEO do Grupo Malwee, entre outros.

“Temos mais dois anos de ‘runaway’, com receita zero, até a próxima captação”, diz Daniel. Hoje com 15 pessoas na equipe, a meta é dobrar o quadro ao longo deste ano, com contratação especialmente para áreas de tecnologia e produto. “Queremos seguir uma estrutura de empresa de software. Não vamos escalar bastante atendimento”, diz o empreendedor.

Desde pequeno

Empreendedor esse que começou cedo nos negócios. Hoje com 24 anos, Daniel programa desde criança e aos 14 criou um aplicativo que atualizava a agenda telefônica das pessoas, adicionando o ‘9’ na frente dos números de celular. “Tivemos quase 25 mil downloads, que me renderam quase US$ 20 mil”, conta.

Daniel chegou a desenvolver, ainda, a versão em iPad do site Finanças Femininas, fundado pela irmã, a jornalista Carolina Sandler. “Acabei virando o menino dos apps”, brinca.

Depois, ele começou a engenharia da computação no Insper, mas, inquieto, decidiu trancar o curso e foi morar nos EUA e estudar ciências cognitivas na Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Quando voltou ao Brasil, partiu para a empreitada de montar o UmHelp. A partir daí, a história você já conhece.

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